Hoje, completei meu 19º
ano de pai. Ou 20º, se se puder considerar o filho ainda no ventre, a promessa
depois cumprida.
E, entretanto, não
houve ainda acúmulo de decênios que me trouxesse explicação para isso de ser
pai. Essa improvável expansão de si mesmo a partir do outro, esse estender-se
para fora de si, esse abrir-se em céus e abismos, glórias e tormentas antes
sequer imagináveis.
Que encanto é esse,
incompreensível, a desdobrar-se sobre outrem de tal modo que basta um sorriso
bobo, um gesto mínimo, uma palavra mal balbuciada, um passo vacilante para nos
fazer sentir divinos?
O que é isso, tão
forte, que nos muda a noção do tempo? A vida passa a dividir-se diferente, em
tempos de relação: o tempo da dependência total, dos sentimentos expressos em
olhares e sorrisos, em gemidos e choros. O tempo das tentativas. O tempo da
proteção. O tempo de virar gente. O
tempo do desabrochar com qualidades próprias. O tempo de descobrir outros
mundos. E o mais difícil tempo, o do afastar-se em busca de outros braços.
Meu pai já se foi, faz
tempo. Hoje, gostaria de poder dizer-lhe tanto! Que agora eu entendo. Que agora
eu queria pedir tantos perdões – e hoje sei que receberia todos! E que hoje eu não
negaria abraços, e convívio, e conversas, e tardes “inúteis” de apenas estar
junto.
Mas foi-se o tempo. E
gira essa roda viva, que passa adiante a dupla dor: de não ter sido ontem como
hoje se queria e de saber que não se receberá hoje o que ontem foi sonegado.
Entretanto, com as
dores de mão dupla só compreendidas depois da paternidade, vêm tantas alegrias,
tantas, que não há dor que as suplante. E nessas emoções impossíveis é que a
alma se dilata e torna-se capaz de qualquer coisa, em nome de outro ser.
Como elo dessa divina
corrente de vida, hoje, só posso dizer: obrigado, meu pai, por me fazer filho!
Obrigado, meu filho, por me fazer pai!