Saturday, May 17, 2008

Lição da rua

Há muitos anos, quando era repórter de um jornal diário, levei um "fora" da namorada. Naturalmente, fiquei arrasado. Confesso que não tanto pelo amor alheio recusado, mas muito mais pelo amor-próprio ferido - afinal, estávamos no começo do relacionamento, naquela fase de esperanças mais que de grandes afetos. De qualquer modo, fiquei mesmo down, como se costuma dizer hoje (em idos tempos, a pessoa "ficava na fossa").

Fui trabalhar. No jornal, cabia-me uma pauta um tanto pesada: fazer uma matéria na ala de queimados do Hospital Evangélico de Curitiba. Lá fui eu. Saí do hospital completamente diferente. Vi que meu grande "problema" era nada e agradeci a Deus pela minha vida privilegiada.

Nesta semana, veio-me essa antiga lembrança quando recebi outra lição "da rua". Estava voltando para casa, absorto em pensamentos sobre os muitos "grandes" problemas do dia-a-dia, quando vi, de relance, um homem parado numa esquina. Os poucos segundos durante os quais o olhei foram suficientes para perceber que ele estava muito incomodado. Não tive a reação imediata de parar o carro, mas a visão daquele homem me impressionou tanto que dei a volta na quadra. Parei o carro, desci e fui até ele perguntar se estava precisando de alguma coisa.

Era um homem, de cerca de 35 a 40 anos, pobremente vestido, com dentes carcomidos. E cego, desses que andam com uma bengalinha para desviar dos obstáculos do caminho. Chorando, ele contou que tinha chegado ali caminhando a pé desde um bairro distante porque marcara encontro com um casal que havia prometido ajudá-lo a comprar uma cesta básica e material para fazer as vassouras que vendia nas ruas. Mas o casal não tinha aparecido. Ele então foi à igreja do bairro, onde lhe disseram também não poder ajudá-lo. O homem não conhecia o bairro, não sabia locomover-se direito por ali. Procurei ajudá-lo de modo que ele ficasse satisfeito. Não sei se sua história era verdadeira (acreditei que sim, afinal, ele não tinha me pedido nada, fui eu quem o abordei, e ele parecia sincero), mas, de qualquer modo, recebi dele muito mais do que lhe dei.

Entretanto, ao contrário do dia da reportagem no hospital, embora considerar a situação alheia também tenha me aberto os olhos para pesar melhor minha realidade, fiquei triste: os "queimados" estavam sendo atendidos num bom hospital, com toda a estrutura e assistência necessárias, e eu não poderia fazer nada melhor por eles. Com aquele homem, não: eu poderia ajudá-lo muito mais. Poderia talvez fazer alguma diferença importante na sua vida. Minha ajuda restringiu-se àquela ocasião, mas a vida do homem cego continuaria igual no dia seguinte.
O que fazer? Como (quase) todo mundo, continuar a vida, a luta cotidiana, fingindo que o que vemos ao nosso redor não nos diz respeito? Onde encontrar uma resposta?

Friday, May 16, 2008

Por falar nisso... "jornalite" ou "opinionismo"

"Jornalite" = jornalismo + palpite. "Opinionismo" = opinião barata disfarçada de jornalismo. Inventei esses termos para designar uma mania dolorosa de alguns jornalistas e veículos que disfarçam com cara de jornalismo palpites e opiniões infundadas. Claro que existe o jornalismo opiniativo, mas este supõe, primeiro, que a manifestação de opinião seja explícita para o receptor e, em segundo lugar, que a opinião seja fundamentada em argumentação consistente e em conhecimento sobre o assunto do qual se fala.

Não é o que tenho visto e ouvido por aí. E não estou falando só daqueles veículos que há muito deixaram de informar para apenas opinar sob o disfarce da informação, fazendo campanha descarada contra ou a favor de qualquer coisa e esquecendo que deveriam simplesmente oferecer informação de qualidade ao público. Refiro-me a certos veículos e jornalistas que tratam o público como um bando de retardados mentais para os quais não basta apenas uma boa informação, mas é preciso a palavra "esclarecedora" do "profundo" analista. Basta pensar em certos "jornalistas" (estou pensando especialmente no rádio) que adoram comentar tudo, qualquer coisa, como se fossem "professores de Deus" especialistas em todos os assuntos possíveis e imagináveis. Meu Deus, quanta bobagem! Quanta besteira dita em tom sério!

Já vi apresentador dando conselhos ao papa, dizendo como Bento 16 deveria governar a Igreja. Seria alguém com vocação enrustida para cardeal? Outro mostrando soluções facílimas para a crise aérea, verdadeiros "ovos de Colombo", nas quais nenhum especialista jamais havia pensado antes (por que será?). Ou outro ainda dizendo que as pessoas fazerem falcatruas e não sofrerem nenhuma conseqüência é coisa de carioca.

Eu disse "professor de Deus"? Há quem parece se achar o próprio, pois julgou que o "padre dos balões" estava desaparecido porque certamente já devia estar no inferno. Parece aquele sujeito que dizia acreditar em Deus porque o via todos os dias de manhã, ao olhar no espelho...

Agruras do rádio ao vivo...

Dia 25 de abril de 2008, por volta das 17h45min, rádio BandNews FM. Boris Casoy fala da epidemia de dengue no Rio de Janeiro e tenta comentar as mortes por dengue hemorrágica. Lembra que é acometido dessa modalidade da doença quem pega dengue pela segunda vez. Quer ressaltar o "azar" de quem é vitimado pela dengue hemorrágica e diz que isso é ..."uma fatalidade fatal que muitas vezes pode levar à morte" (transcrição literal entre aspas).
É... Isso me fez lembrar as palavras de uma "rainha do rádio", dos antigos tempos, a quem perguntaram como ela conseguia fazer rádio sempre falando ao vivo. Ela respondeu que não via problema nenhum, pois todo mundo, inclusive ela, passava a vida toda falando só ao vivo... O que ela diria se ouvisse rádio hoje?

Thursday, May 15, 2008

Ética jornalística?

Recebi um exemplar gratuito de uma tal "Revista da Semana". Enquanto os professores lutam contra a invasão do plágio nas produções escolares, da pré-escola à pós-graduação, a Editora Abril mostra que dá, sim, para ganhar dinheiro roubando trabalho alheio sem ser incomodado. A tal revistinha é toda "chupada" - não tem uma matéria própria assinada por jornalista, só textos retirados de agências (supõe-se que pelos menos esses serviços sejam pagos pela Abril) e de outros veículos. Um descaramento total, sem a menor vergonha.
Notinhas resumidas de matérias da Folha, do Estadão, O Globo, The New York Times, Independent, International Herald Tribune etc. etc. As grandes empresas de comunicação que têm lutado contra a obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo devem estar gostando, pois a Abril mostra que nem precisa de jornalistas para fazer uma revista. Basta um "empacotador", que resuma textos feitos por outros, de qualquer lugar do mundo, disponíveis na internet.
E ainda tiveram a desfaçatez de me oferecer uma assinatura da revistinha! Não, senhores, obrigado: tenho computador com acesso à internet e posso procurar por mim mesmo as notícias de meu interesse. E não pactuo com a ilegalidade e a falta de ética.

No lugar errado

Carlos Minc no Ministério do Meio Ambiente? Ele seria o nome certo para o Ministério da Indústria e Comércio...

Ministra deveria ser presa?

Pela lógica de alguns ilustres membros do Judiciário brasileiro, a ministra de Políticas para as Mulheres, Nilcéa Freire, deveria ser presa. Ela publicou um artigo sob o título "Fúria judicial contra mulheres", reproduzido em inúmeros veículos por todo o país. No artigo, a ministra defende a prática do aborto. Ora, o aborto é crime - portanto, defender sua prática é fazer apologia do crime.
Por que se calam a esse respeito os mesmos "zelosos" juízes que proibíram em diversas cidades a marcha pela legalização da maconha? Onde estão os laboriosos membros do Ministério Público que moveram o Judiciário para que a marcha fosse proibida? Dois pesos, duas medidas... que indicam o atraso da nossa "democracia", que ainda proíbe discussão de idéias e manifestação de pensamento.
Vamos gritar de novo, décadas depois: "Abaixo a ditadura!" Pela plena liberdade de expressão!

Wednesday, May 14, 2008

Como fazer um clube vencedor

O campeonato paranaense já ficou para trás faz tempo. Mas creio que ainda é oportuno colher lições do desempenho do Atlético Paranaense na competição. Algumas considerações...

1) A diretoria do CAP não aceitou a cota de R$ 1 milhão oferecida pela TV. O que ganhou com isso? A antipatia do torcedor, que não pôde acompanhar pela televisão os jogos do time que quebrou o recorde de vitórias no campeonato. Além de ter perdido a oportunidade de conseguir mais torcedores pela divulgação dos jogos daquele time que, na ocasião, tinha um desempenho espetacular. E, obviamente, deixou de ganhar R$ 1 milhão! É pouco dinheiro?

2) O que se pode fazer com R$ 1 milhão? Manter um jogador do nível de Ferreira ou Claiton, por exemplo. E valeria a pena: valeria um título, o que significa mais torcedores, mais sócios-Furacão, estádio cheio, mais renda. Nota zero para o "tino comercial" de quem não foi capaz de enxergar isso, que parece tão óbvio.

3) Tudo bem que o CAP tem todo direito de cobrar pelas transmissões de rádio. Ele paga os salários dos jogadores, investe, mantém as cabines de rádio. Quem quiser transmitir (e, obviamente, as rádios lucram com essas transmissões) tem que pagar, sim. Só que o modus operandi da diretoria foi o pior possível. Primeiro, o clube deveria negociar as transmissões em conjunto com os outros clubes, já que não joga sozinho (ao que parece, é o que afinal a Futpar vai fazer). Além disso, soou perfeitamente ridículo fazer todo aquele "show" em torno das transmissões e, na contra-mão de seu próprio discurso, transmitir jogos pela internet sem consultar os adversários. Ridículo! Essas atitudes só conseguem a antipatia de muita gente.

4) O auge da insensatez foi proibir a comemoração do título do Coritiba na Arena. Atitude desastrada! Ao anunciar a decisão, a diretoria já deu mostras de não acreditar no time. O discurso deveria ser: quem ganhar vai comemorar, pois os campeões seremos nós. O argumento da segurança "independemente do time que ganhar" é risível - quando o CAP ganhou o campeonato na Arena, não houve qualquer problema. Mais uma atitude antipática. Ouvi uma pessoa desinteressada de futebol dizer que "pegou ódio do Atlético" por causa dessas atitudes.

Enfim, esse é o desabafo de um atleticano. Tomara que o time vá bem, que o clube invista no time - afinal, o CAP é um clube de futebol, e um time de futebol vive de títulos. Quem vive de compra e venda de mercadoria são as empresas, que não têm torcedores, mas acionistas. Embora exija uma administração profissional, o negócio futebol é completamente diferente de uma empresa comercial qualquer. O torcedor, literalmente, veste a camisa, lamenta se o produto é ruim, mas não deixa de consumi-lo e desejar que melhore - e até fazer sacrifício para isso -, ao contrário do que acontece em outros "ramos".
Tomara que a direção aprenda todas as lições do campeonato paranaense. E que venham bons jogadores, partidas memoráveis, títulos, estádio cheio, 30 mil sócios, Arena completa (o que não valerá nada se o time não for um time campeão).

Tezzão!

Cristóvão Tezza está sem dúvida entre os melhores escritores brasileiros da atualidade. Tem obras antológicas, acumula merecidíssimos prêmios e tem um domínio completo do nosso idioma, que maneja maravilhosamente. Além de ser um cara muito bacana. O jornal Gazeta do Povo passou a publicar crônicas suas. Muito saborosas! Divertidíssima a crônica "O dentista coxa-branca". Agora é obrigação acompanhar suas crônicas na Gazeta.

Mídia de dar nojo...

A cobertura do "caso Isabela" dá nojo. Sinto vontade de vomitar quando vejo Willian Waack falar com cara séria sobre o caso, como se fosse a coisa mais importante e relevante do mundo (é claro que é triste, chocante - mas quantos casos parecidos acontecem sem a mesma cobertura?). A "gloriosa" Globo é mais uma em busca do sensacionalismo que renda audiência. Uma emissora "vendida": se deu audiência, dá lucro, e isso é o que importa. Pior é ver jornalistas embarcando nessa. Se a emissora lhes paga o salário, fazem qualquer coisa - é um tipo de prostituição profissional (com todo respeito às prostitutas, que pelo menos dão o que oferecem claramente). Prometer informação útil e relevante e vender-se ao sensacionalismo é nojento, degradante.
Pior é ver o Judiciário, na rabeira da mídia, "jogando para a torcida", como escreveu muito apropriadamente o advogado Adel el Tasse. Aqueles que deveriam julgar com isenção se rendem à sedução da mídia. Indignante!

Rubens Barrichello: um vencedor

Tem gente que tem mania de criticar o piloto Rubens Barrichello, o Rubinho. Mania ridícula. Rubinho é um dos melhores pilotos do mundo. Já foi vice-campeão de Fórmula 1, é o recordista em número de grandes-prêmios disputados. Merece respeito. Ninguém sobrevive tanto tempo num ambiente extremamente competitivo se não for competente. Quem acha que ele não merece elogios, pergunte a si mesmo: "Sou um dos 20 melhores do mundo na minha profissão?" Rubinho é. E há muito tempo. Eu ficaria muito feliz se fosse reconhecido como um dos 20 melhores jornalistas do mundo. Você, leitor, está entre os 20 melhores do mundo em alguma coisa?