Monday, January 24, 2011

Tudo é novidade?

Nas escolas de Jornalismo, os estudantes aprendem que uma matéria ou reportagem precisa ter um “gancho”. No jargão jornalístico, “gancho” é aquilo que justifica a publicação de uma matéria, a oportunidade de publicá-la. Fala-se em “gancho” no jornalismo diário. Qual o sentido, por exemplo, de se publicar num diário uma matéria sobre a história da cerveja? Pode ser uma matéria interessante, bem escrita, mas para o leitor de um jornal que quer saber as notícias do dia, ela não tem sentido.

Claro que isso não é regra geral para cadernos especiais ou publicações semanais. Um caderno de gastronomia poderia tratar da história da cerveja em qualquer tempo - o gancho, nesse caso, é temático, ligado à proposta do caderno. Uma revista mensal sobre automóveis antigos poderia fazer uma reportagem especial sobre os carros mais raros em mãos de colecionadores brasileiros - em qualquer edição, sem necessidade de outro “gancho” que o tema da revista.

Faço esses comentários prévios para manifestar minha surpresa ante uma matéria de página inteira publicada no caderno Vida e Cidadania da Gazeta do Povo de 22 de janeiro de 2011 sob o título “Um novo olhar sobre a Idade Média”. O que justifica a publicação desse texto? Não consegui perceber. Pensei que tratasse do lançamento de um livro sobre o tema, mas não, não havia nada disso na matéria.

Bem, isso também não é assim tão grave. Os jornais estão, com o perdão do neologismo, se “revistizando”. As edições dominicais dos grandes diários de há muito se assemelham, em grande parte de suas páginas, a uma revista semanal. Mais recentemente, com a concorrência da internet e seu imediatismo, os diários passaram a publicar mais textos com “estilo de revista”. De qualquer maneira, caberia ao autor indicar ao leitor a razão da publicação do texto.

Entretanto, isso não é o que mais chama a atenção na página em questão, mas o seu conteúdo. Esse “novo olhar”, na verdade, é muito, muito velho. Há pelo menos 30 anos leio livros com conteúdo revisionista em relação à Idade Média. Na Europa, a “revisão” é muito anterior. Realmente, não há como apresentar o fato como algo novo. Se fosse mesmo novo, teria um “gancho” na atualidade, que a reportagem não apresenta.

A impressão que tenho lendo certos textos nos jornais de hoje, cheios de gente jovem, é que para essa juventude (como é natural) tudo é novidade, como o caso do cinema fechado há “distantes” 16 anos (veja o post anterior “Coisa de inexperiência”). Parecem adolescentes escrevendo para adolescentes. Será mesmo esse o público dos jornais impressos de hoje?

4 comments:

eriel said...

er... sem querer polemizar a escrita nacional pelos concidadãos, mas o que dizer do tal "parágrafo", que se usa só quando quem escreve acha que já está muito grande "aquela frase"? e, então, passa pra outra linha...

Tomás Barreiros said...

Pois é, essa é outra. Lembra-me quando eu era criança e escrevi minha primeira carta, para uma tia. Dei para minha mãe ler e avaliar se estava boa. Ela disse que sim, embora faltassem algumas vírgulas. Eu então polvilhei vírgulas ao longo da carta toda, sem sequer a ler... Deve ter ficado engraçada. Às vezes parece que tem gente adulta que escreve meio assim, né? Vai separando os parágrafos de tantas em tantas linhas...

Daiana Geremias said...

Eu adoro esse tom crítico que você consegue dar às palavras. E respeito, sempre, a sua opinião.
Visitar seu blog é uma coisa que me faz matar a saudade dos meus tempos de aula (sim, eu sinto saudade).
Um grande abraço, meu monstro favorito!
E continue assim, espalhando a sua opinião e ensinando tudo aquilo que devia ser óbvio mas, como no ótimo exemplo citado, nem sempre ganha atenção nos veículos de comunicação.
Até mais.

Tomás Barreiros said...

Então, senhora escritora, apareça sempre por aqui. Também tenho saudades daquela turminha superespecial. E não se esqueça de pôr seu livro no Sangue Novo!