Continuando a tratar do tema “os crimes da escola”, reproduzo a seguir mais um texto que circula pela internet, atribuído ao professor Waldemar Setzer, da USP, e também muito interessante para levantar reflexões sobre o assunto.
Revoltado ou criativo?
Por Waldemar Setzer, professor aposentando da USP
Há algum tempo, recebi um convite de um colega para servir de árbitro na revisão de uma prova. Tratava-se de avaliar uma questão de Física que recebera nota zero. O aluno contestava tal conceito, alegando que merecia nota máxima pela resposta, a não ser que houvesse uma “conspiração do sistema” contra ele. Professor e aluno concordaram em submeter o problema a um juiz imparcial, e eu fui o escolhido.
Chegando à sala de meu colega, li a questão da prova, que dizia: “Mostre como se pode determinar a altura de um edifício bem alto com o auxilio de um barômetro.” A resposta do estudante foi a seguinte: “Leve o barômetro ao alto do edifício e amarre uma corda nele; baixe o barômetro até a calçada e em seguida levante-o, medindo o comprimento da corda; este comprimento será igual à altura do edifício.”
Sem dúvida, era uma resposta interessante e de alguma forma correta, pois satisfazia o enunciado. Por instantes, vacilei quanto ao veredicto. Recompondo-me rapidamente, disse ao estudante que ele tinha forte razão para ter nota máxima, já que havia respondido a questão completa e corretamente. Entretanto, se ele tirasse nota máxima, estaria caracterizada uma aprovação em um curso de Física, mas a resposta não confirmava isso. Sugeri então que fizesse outra tentativa para responder a questão. Não me surpreendi quando meu colega concordou, mas sim quando o estudante resolveu encarar aquilo que eu imaginei que lhe seria um bom desafio.
Segundo o acordo, ele teria seis minutos para responder à questão, isto após ter sido prevenido de que sua resposta deveria mostrar, necessariamente, algum conhecimento de Física.
Passados cinco minutos, ele não havia escrito nada, apenas olhava pensativamente para o forro da sala. Perguntei-lhe então se desejava desistir, pois eu tinha um compromisso logo em seguida e não tinha tempo a perder. Mais surpreso ainda fiquei quando o estudante anunciou que não havia desistido. Na realidade, tinha muitas respostas e estava justamente escolhendo a melhor. Desculpei-me pela interrupção e solicitei que continuasse.
No momento seguinte, ele escreveu esta resposta: “Vá ao alto do edifício, incline-se numa ponta do telhado e solte o barômetro, medindo o tempo t de queda desde a largada até o toque com o solo. Depois, empregando a fórmula h=(1/2)gt2, calcule a altura do edifício.”
Perguntei então ao meu colega se ele estava satisfeito com a nova resposta e se concordava com minha disposição de conferir praticamente a nota máxima à prova. Concordou, embora eu sentisse nele uma expressão de descontentamento, talvez inconformismo.
Ao sair da sala, lembrei-me que o estudante havia dito ter outras respostas para o problema. Embora já sem tempo, não resisti à curiosidade e perguntei-lhe quais eram essas respostas.
“Ah, sim!” – disse ele – “Há muitas maneiras de se achar a altura de um edifício com a ajuda de um barômetro.”
Perante a minha curiosidade e a já perplexidade de meu colega, o estudante desfilou as seguintes explicações: “Por exemplo, num belo dia de sol, pode-se medir a altura do barômetro e o comprimento de sua sombra projetada no solo, bem como a do edifício. Depois, usando-se uma simples regra de três, determina-se a altura do edifício. Outro método básico de medida, aliás bastante simples e direto, é subir as escadas do edifício fazendo marcas na parede, espaçadas da altura do barômetro. Contando-se o número de marcas, ter-se-á a altura do edifício em unidades barométricas. Um método mais complexo seria amarrar o barômetro na ponta de uma corda e balançá-lo como um pêndulo, o que permite a determinação da aceleração da gravidade (g). Repetindo a operação ao nível da rua e no topo do edifício, tem-se dois valores de g, e a altura do edifício pode, a princípio, ser calculada com base nessa diferença.
“Finalmente” – concluiu –, “se não for cobrada uma solução física para o problema, existem outras respostas. Por exemplo, pode-se ir até o edifício e bater à porta do síndico. Quando ele aparecer, diz-se: Caro senhor síndico, trago aqui um ótimo barômetro; se o senhor me disser a altura deste edifício, eu lhe darei o barômetro de presente.”
A esta altura, perguntei ao estudante se ele não sabia qual era a resposta “esperada” para o problema. Ele admitiu que sabia, mas estava tão farto com as tentativas dos professores de controlar o seu raciocínio e cobrar respostas prontas com base em informações mecanicamente arroladas que ele resolveu contestar aquilo que considerava, principalmente, uma farsa.
Monday, February 15, 2010
Tuesday, February 09, 2010
Os crimes da escola
Estou de volta! Depois das férias, espero atualizar mais frequentemente o blog.
Para recomeçar, um tema de minha preocupação permanente: o papel da escola como elemento de controle social (uma “aparelho ideológico do Estado”, no dizer de Althusser).
A escola, como geralmente tem sido, é uma instituição criminosa, feita para embotar as mentes. Mais adiante, colocarei outras reflexões sobre o tema. Por ora, reproduzo abaixo um texto bem difundido, de cuja origem não estou certo, mas que conheço há muito tempo e que sempre revejo publicado aqui e acolá. É um texto magnífico que revela a pior face da escola...
O menininho
Helen E. Buckley
Era uma vez um menininho que contrastava com sua escola, bastante grande. Uma manhã, a professora disse que os alunos iriam fazer um desenho.
– Que bom! – pensou o menininho. Ele gostava de fazer desenhos.
Ele pegou sua caixa de lápis de cor e começou a desenhar. Mas a professora disse para esperar, que ainda não era hora de começar. E ela esperou até que todos estivessem prontos.
– Agora – disse a professora –, nós iremos desenhar flores.
– Que bom! – pensou o menininho. Ele gostava de desenhar flores e começou a desenhar flores com lápis rosa, azul e laranja. Mas a professora disse que ia mostrar como fazer.
E a flor da professora era vermelha com caule verde.
– Assim – disse a professora –, agora vocês podem começar.
O menininho olhou para a flor da professora, então olhou para a sua flor. Gostou mais da sua flor, mas não podia dizer isso. Ele virou o papel e desenhou uma flor igual à da professora.
Num outro dia, quando o menininho estava numa aula ao ar livre, a professora disse que os alunos iriam fazer alguma coisa com o barro.
– Que bom! – pensou. Ele gostava de trabalhar com o barro. Ele pensou que podia fazer com o barro todos os tipos de coisas: elefantes, camundongos, carros e caminhões. Começou a juntar e amassar a sua bola de barro. Mas a professora disse para esperar.
E ela esperou até que todos estivessem prontos.
– Agora – disse a professora –, nós iremos fazer um prato.
– Que bom! – pensou o menininho. Ele gostava de fazer pratos de todas as formas e tamanhos.
Mas a professora disse que era para esperar, que iria mostrar como fazer.
E ela mostrou a todos como fazer um prato fundo.
– Assim – disse a professora –, agora vocês podem começar.
O menininho olhou para o prato da professora, olhou para o próprio prato e gostou mais do seu, mas ele não podia dizer isso. Amassou seu barro numa grande bola novamente e fez um prato fundo igualzinho ao da professora.
E muito cedo o menininho aprendeu a esperar e a olhar e a fazer as coisas exatamente como a professora. E muito cedo ele não fazia mais coisas por si próprio.
Então, aconteceu que o menininho e a sua família se mudaram para outra cidade, e o menininho teve que ir para outra escola.
Essa escola era ainda maior que a primeira.
No primeiro dia, a professora disse que os alunos fariam um desenho.
– Que bom! – pensou o menininho. E esperou que a professora dissesse o que fazer. Ela não disse. Apenas andava pela sala. Quando chegou perto do menininho, perguntou:
– Você não quer desenhar?
– Sim, mas o que vamos desenhar?
– Eu não sei, até que você desenhe.
– Como posso fazer meu desenho?
– Da maneira que você gostar.
– E de que cor?
– Se todo mundo fizer o mesmo desenho e usar as mesmas cores, como eu posso saber qual o desenho de cada um?
– Eu não sei... – disse o menininho.
E começou a desenhar uma flor vermelha com caule verde.
Para recomeçar, um tema de minha preocupação permanente: o papel da escola como elemento de controle social (uma “aparelho ideológico do Estado”, no dizer de Althusser).
A escola, como geralmente tem sido, é uma instituição criminosa, feita para embotar as mentes. Mais adiante, colocarei outras reflexões sobre o tema. Por ora, reproduzo abaixo um texto bem difundido, de cuja origem não estou certo, mas que conheço há muito tempo e que sempre revejo publicado aqui e acolá. É um texto magnífico que revela a pior face da escola...
O menininho
Helen E. Buckley
Era uma vez um menininho que contrastava com sua escola, bastante grande. Uma manhã, a professora disse que os alunos iriam fazer um desenho.
– Que bom! – pensou o menininho. Ele gostava de fazer desenhos.
Ele pegou sua caixa de lápis de cor e começou a desenhar. Mas a professora disse para esperar, que ainda não era hora de começar. E ela esperou até que todos estivessem prontos.
– Agora – disse a professora –, nós iremos desenhar flores.
– Que bom! – pensou o menininho. Ele gostava de desenhar flores e começou a desenhar flores com lápis rosa, azul e laranja. Mas a professora disse que ia mostrar como fazer.
E a flor da professora era vermelha com caule verde.
– Assim – disse a professora –, agora vocês podem começar.
O menininho olhou para a flor da professora, então olhou para a sua flor. Gostou mais da sua flor, mas não podia dizer isso. Ele virou o papel e desenhou uma flor igual à da professora.
Num outro dia, quando o menininho estava numa aula ao ar livre, a professora disse que os alunos iriam fazer alguma coisa com o barro.
– Que bom! – pensou. Ele gostava de trabalhar com o barro. Ele pensou que podia fazer com o barro todos os tipos de coisas: elefantes, camundongos, carros e caminhões. Começou a juntar e amassar a sua bola de barro. Mas a professora disse para esperar.
E ela esperou até que todos estivessem prontos.
– Agora – disse a professora –, nós iremos fazer um prato.
– Que bom! – pensou o menininho. Ele gostava de fazer pratos de todas as formas e tamanhos.
Mas a professora disse que era para esperar, que iria mostrar como fazer.
E ela mostrou a todos como fazer um prato fundo.
– Assim – disse a professora –, agora vocês podem começar.
O menininho olhou para o prato da professora, olhou para o próprio prato e gostou mais do seu, mas ele não podia dizer isso. Amassou seu barro numa grande bola novamente e fez um prato fundo igualzinho ao da professora.
E muito cedo o menininho aprendeu a esperar e a olhar e a fazer as coisas exatamente como a professora. E muito cedo ele não fazia mais coisas por si próprio.
Então, aconteceu que o menininho e a sua família se mudaram para outra cidade, e o menininho teve que ir para outra escola.
Essa escola era ainda maior que a primeira.
No primeiro dia, a professora disse que os alunos fariam um desenho.
– Que bom! – pensou o menininho. E esperou que a professora dissesse o que fazer. Ela não disse. Apenas andava pela sala. Quando chegou perto do menininho, perguntou:
– Você não quer desenhar?
– Sim, mas o que vamos desenhar?
– Eu não sei, até que você desenhe.
– Como posso fazer meu desenho?
– Da maneira que você gostar.
– E de que cor?
– Se todo mundo fizer o mesmo desenho e usar as mesmas cores, como eu posso saber qual o desenho de cada um?
– Eu não sei... – disse o menininho.
E começou a desenhar uma flor vermelha com caule verde.
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