Um dos prazeres da vida adulta é poder realizar alguns desejos de criança – mesmo que, em geral, a realização seja um tanto frustrante, pois o sonho alcançado invariavelmente fica longe do sabor do sonho sonhado em tenra idade.
Lembro-me, por exemplo, do meu gosto infantil por camarão. Morávamos longe do mar, e camarão era iguaria fina e cara, ao menos para minha família. Uma vez por ano, nas férias de verão, viajávamos para a praia. Geralmente, as refeições eram em casa, com peixe fresco comprado dos pescadores à beira mar. Ou então, quando as condições do clima ajudavam, caçávamos rãs à noite para saboreá-las no almoço do dia seguinte. Sim, era uma caça, e bem primitiva: cada um com sua lanterna e seu bornal, capinhas plásticas de chuva, botas sete-léguas. Tínhamos que andar por um banhado procurando as rãs, lançar sobre seus olhos a luz da lanterna, que as hipnotizava, e simplesmente pegá-las com a mão e colocá-las no bornal.
Durante a temporada, vez ou outra, íamos a um restaurante. Meu pai não era pobre, mas tinha sido – por isso, embora não fosse nem de longe mesquinho, era econômico, o que fazia com que as poucas idas ao restaurante fossem valorizadas. Para mim, o máximo do máximo era comer camarão à grega no restaurante Baleia, em Santos. Até hoje tenho recordações daquele gosto, jamais reencontrado. Nem sei se o restaurante ainda existe – e na época devia ser meio “cafona” aquela casa com formato de baleia, parente de um congênere curitibano em forma de avião, há anos devidamente demolido...
Hoje, posso comer camarão à vontade. Não é tão caro e raro como na minha infância. E, é claro, nem tão saboroso como naqueles tempos, infelizmente...
Dia desses, lembrei-me de um desejo infantil que repousava escondido num cantinho qualquer da memória. Precisei recortar alguns jornais. Usei um estilete e uma régua, lamentavelmente torta. Fui então a uma papelaria em busca de uma régua retilineamente perfeita como devem ser as réguas. E lá encontrei, de uma só vez, a lembrança infantil e o objeto dela: penduradas em meio a incontáveis esquadros, compassos e réguas de plástico, as réguas de metal.
Meus olhos brilharam: as réguas de metal! Aquelas inacessíveis réguas com as quais sonhei em criança! Réguas caras, vinte vezes mais caras que as que meu pai comprava a cada ano quando renovávamos o material escolar. Nunca tive uma delas, sequer ousei pedir, pois eram caras, muito caras.
Emocionado, peguei uma delas. Conferi os preços: as menores, pouco mais de sete reais. As grandes, o dobro. Esse era o preço do sonho infantil! Tirei-as reverente das embalagens, medi com olhos e mãos suas silhuetas irreprochavelmente retas, retas, retas. Suspirei. Comprei duas, uma de cada tamanho.
Foi com imenso prazer que pus aquela grande régua de metal sobre os jornais. Passei religiosamente a lâmina do estilete sobre o papel, encostando-a bem na aresta dura, sem o receio de que acontecesse o acidente comum com as réguas plásticas nessas operações: o estilete afiado cortá-las junto com o papel.
Peguei todos os recortes de jornal que já tinha feito. Fui aparando-os um a um com o estilete e a régua de metal. Perfeito. Perfeito.
Minhas duas réguas estão guardadas com carinho. Sempre que posso, uso-as – uma ou outra, conforme o tamanho do papel a cortar. Mantenho-as com cuidado nas embalagens originais. Acaricio-as antes e depois do uso. Já aconteceu de alguém me surpreender pensativo tentando ver o próprio reflexo na superfície fosca do metal. Consigo ver uma imagem turva, de um garotinho quase quarenta anos mais novo que eu...
Friday, August 29, 2008
Piadinhas eleitorais...
Como já disse, o horário eleitoral gratuito no rádio e na TV oferece diversão garantida... Em meio aos candidatos a vereador com nomes sugestivos como "Maria do Facão" e "Gogó de Ouro", algumas "pérolas"...
A candidata "Camila cantora" propõe aposentadoria para dona-de-casa. Outra promete lutar pela aposentaria para profissionais da saúde aos 25 anos de serviço. Então, descobrimos que vereadores podem legislar sobre aposentadoria...
Infelizmente, creio não ser temerário dizer que é bem provável que boa parte dos eleitores não saiba o que faz um vereador. Se um candidato diz uma coisa dessas, das duas uma: ou também não sabe e, portanto, não merece (aliás, não poderia!) ser eleito, ou quer enganar os eleitores (mais uma razão para receber o repúdio do eleitorado).
A candidata "Camila cantora" propõe aposentadoria para dona-de-casa. Outra promete lutar pela aposentaria para profissionais da saúde aos 25 anos de serviço. Então, descobrimos que vereadores podem legislar sobre aposentadoria...
Infelizmente, creio não ser temerário dizer que é bem provável que boa parte dos eleitores não saiba o que faz um vereador. Se um candidato diz uma coisa dessas, das duas uma: ou também não sabe e, portanto, não merece (aliás, não poderia!) ser eleito, ou quer enganar os eleitores (mais uma razão para receber o repúdio do eleitorado).
Wednesday, August 27, 2008
"Como é mesmo o MEU nome?"
Na Língua Portuguesa, o "s" entre duas vogais tem som de "z", como, por exemplo, em "casa", "fase", "atraso" etc. O nome da candidata do PT à prefeitura de Curitiba, Gleisi Hoffmann, é invariavelmente pronunciado nas propagandas do partido como se tivesse dois "s" ou um "c" ("Gleissi" ou "Gleici"). Será que a menina cresceu ouvindo seu nome errado e se acostumou?
Antes que alguém pergunte: não, as regras não mudam para nomes próprios, salvo quando são nomes estrangeiros pronunciados conforme a língua de origem. Nome escrito em português segue as regras da Língua Portuguesa. Se o nome Gleisi for pronunciado em alemão, por causa da ascendência da candidata, ficará algo mais ou menos como "Glaizi".
Antes que alguém pergunte: não, as regras não mudam para nomes próprios, salvo quando são nomes estrangeiros pronunciados conforme a língua de origem. Nome escrito em português segue as regras da Língua Portuguesa. Se o nome Gleisi for pronunciado em alemão, por causa da ascendência da candidata, ficará algo mais ou menos como "Glaizi".
Tuesday, August 26, 2008
Rescaldo olímpico
Algumas considerações a propósito das Olimpíadas...
1) O desempenho do Brasil na Olimpíada de Pequim, conforme esperado, foi pífio, ridículo. O Brasil está entre os dez maiores países do mundo em termos econômicos, territoriais e de população. Seria de se esperar, portanto, que estivesse entre os dez maiores medalhistas olímpicos. Mas fica longe, muito longe disso.
2) As Olimpíadas são, muito mais que qualquer coisa, um evento político-comercial a anos-luz do chamado “espírito olímpico”, que, afinal, quase não existe. Olimpíadas são a exibição de um chauvinismo exacerbado, com sua exaltação de bandeiras e hinos nacionais e um espírito de competição que muitas vezes parece beirar o belicismo.
3) Ainda sobre o “espírito olímpico”: quem compete hoje “pelo seu país”? Quase todos os atletas que lá estão buscam honra, fama, glória e dinheiro. Prova inconteste disso é a recusa de muitos atletas de ponta em participar dos Jogos, pois já lhes sobram fama e dinheiro. Ademais, há os “nacionais” fajutos, que se “naturalizam” por um país qualquer apenas para poderem competir. A lista deles na Olimpíada de Pequim é grande. Se o Comitê Olímpico Internacional quisesse coibir essa atitude, deveria estabelecer que atletas naturalizados só pudessem participar das Olimpíadas depois de pelo menos cinco anos de naturalização.
4) O esporte de alto rendimento hoje, ao contrário do que a mídia alardeia, é prejudicial à saúde, pois exige do corpo humano que vá além dos limites naturais (daí o uso tão comum de doping). Por isso, é falácia querer associar esse tipo de competição à idéia de saúde.
5) Os competidores sabem que uma medalha olímpica pode representar a redenção financeira. É a “coisificação” do homem, transformado em “máquina de ganhar”. Aos vencedores, tudo (especialmente fama e dinheiro); aos derrotados, vergonha e lágrimas.
6) Todas as críticas que possam ser feitas às Olimpíadas, entretanto, não tiram do esporte em si sua importância. A prática esportiva regular, como entretenimento e – aí sim – elemento de uma vida saudável, é importante. Mais ainda: o esporte, hoje ligado à indústria do entretenimento, é um meio de inclusão e ascensão social. Nesse sentido, o resultado de um país nos Jogos Olímpicos é um índice da importância que ele dá ao esporte.
7) Para o Brasil, mais importante que melhorar o rendimento olímpico, é estabelecer uma política séria de inclusão pelo esporte. Se o esporte for bem utilizado como elemento de inclusão e ascensão social, sobretudo a partir da prática nas escolas (incluindo universidades, “segredo” do sucesso de alguns países nas competições internacionais), um dos reflexos (insisto: dos menos importantes) será uma participação melhor do país nas Olimpíadas.
1) O desempenho do Brasil na Olimpíada de Pequim, conforme esperado, foi pífio, ridículo. O Brasil está entre os dez maiores países do mundo em termos econômicos, territoriais e de população. Seria de se esperar, portanto, que estivesse entre os dez maiores medalhistas olímpicos. Mas fica longe, muito longe disso.
2) As Olimpíadas são, muito mais que qualquer coisa, um evento político-comercial a anos-luz do chamado “espírito olímpico”, que, afinal, quase não existe. Olimpíadas são a exibição de um chauvinismo exacerbado, com sua exaltação de bandeiras e hinos nacionais e um espírito de competição que muitas vezes parece beirar o belicismo.
3) Ainda sobre o “espírito olímpico”: quem compete hoje “pelo seu país”? Quase todos os atletas que lá estão buscam honra, fama, glória e dinheiro. Prova inconteste disso é a recusa de muitos atletas de ponta em participar dos Jogos, pois já lhes sobram fama e dinheiro. Ademais, há os “nacionais” fajutos, que se “naturalizam” por um país qualquer apenas para poderem competir. A lista deles na Olimpíada de Pequim é grande. Se o Comitê Olímpico Internacional quisesse coibir essa atitude, deveria estabelecer que atletas naturalizados só pudessem participar das Olimpíadas depois de pelo menos cinco anos de naturalização.
4) O esporte de alto rendimento hoje, ao contrário do que a mídia alardeia, é prejudicial à saúde, pois exige do corpo humano que vá além dos limites naturais (daí o uso tão comum de doping). Por isso, é falácia querer associar esse tipo de competição à idéia de saúde.
5) Os competidores sabem que uma medalha olímpica pode representar a redenção financeira. É a “coisificação” do homem, transformado em “máquina de ganhar”. Aos vencedores, tudo (especialmente fama e dinheiro); aos derrotados, vergonha e lágrimas.
6) Todas as críticas que possam ser feitas às Olimpíadas, entretanto, não tiram do esporte em si sua importância. A prática esportiva regular, como entretenimento e – aí sim – elemento de uma vida saudável, é importante. Mais ainda: o esporte, hoje ligado à indústria do entretenimento, é um meio de inclusão e ascensão social. Nesse sentido, o resultado de um país nos Jogos Olímpicos é um índice da importância que ele dá ao esporte.
7) Para o Brasil, mais importante que melhorar o rendimento olímpico, é estabelecer uma política séria de inclusão pelo esporte. Se o esporte for bem utilizado como elemento de inclusão e ascensão social, sobretudo a partir da prática nas escolas (incluindo universidades, “segredo” do sucesso de alguns países nas competições internacionais), um dos reflexos (insisto: dos menos importantes) será uma participação melhor do país nas Olimpíadas.
Tuesday, August 19, 2008
"Eu como você"
TV e rádio passam hoje a ficar mais divertidos com os programas eleitorais obrigatórios. Assistir a um pouquinho desses programas é ter algum riso garantido. Hoje, diverti-me com o Pastor Oliveira, candidato a vereador pelo PMDB. Enquanto ele falava, a legenda anunciava: "Eu como você cidadão curitibano..." E a propaganda anunciava Moreira como "fazedor" e "resolvedor de problemas". Ui! Não seria mal os partidos contarem com assessoria de gente que saiba tratar bem a língua portuguesa...
Sunday, August 10, 2008
Não assista a este vídeo
Tenho alguma consciência ecológica. Como carne de vez em quando (embora possa passar um bom período sem ela, o que faço de tempos em tempos). Achava radicalismo exacerbado e um tanto ridículo o movimento contra o uso de roupas de peles de animais - afinal, se o homem é um animal carnívoro (como tantos outros) e abate animais para comer, por que não aproveitar suas peles e couro?
Entretanto, recebi recentemente pela internet o link para um vídeo da organização People for the Etichal Treatment of Animals (Peta) que mostra a extração de peles na China. A Peta é a organização que fez um cartaz contra o uso de peles com a foto (nua) da nadadora Amanda Beard, da equipe olímpica dos Estados Unidos. O vídeo é extremamente chocante e pode ser um ponto de partida para que o ser humano pense melhor sobre o modo como tem tratado os animais.
Não veja o filme se você não tem estômago forte - ele pode provocar reações orgânicas indesejadas. Aprendi algo que não sabia: para a pele ter boa qualidade, precisa ser extraída do animal ainda vivo.
Ah! Em tempo: com a crise dos alimentos, tem sido divulgada a informação de que para cada quilo de carne produzido gastam-se quatro quilos de grãos. Ou seja, muito mais que qualquer biocombustível, a produção de carne contribui para diminuir os alimentos disponíveis.
Entretanto, recebi recentemente pela internet o link para um vídeo da organização People for the Etichal Treatment of Animals (Peta) que mostra a extração de peles na China. A Peta é a organização que fez um cartaz contra o uso de peles com a foto (nua) da nadadora Amanda Beard, da equipe olímpica dos Estados Unidos. O vídeo é extremamente chocante e pode ser um ponto de partida para que o ser humano pense melhor sobre o modo como tem tratado os animais.
Não veja o filme se você não tem estômago forte - ele pode provocar reações orgânicas indesejadas. Aprendi algo que não sabia: para a pele ter boa qualidade, precisa ser extraída do animal ainda vivo.
Ah! Em tempo: com a crise dos alimentos, tem sido divulgada a informação de que para cada quilo de carne produzido gastam-se quatro quilos de grãos. Ou seja, muito mais que qualquer biocombustível, a produção de carne contribui para diminuir os alimentos disponíveis.
Monday, August 04, 2008
Fórmula "mágica"
Em entrevista coletiva após a derrota do Atlético Paranaense para o Botafogo (3x0), o presidente do Conselho Deliberativo do clube, Mário Celso Petraglia, disse que não tinha a "fórmula mágica" para fazer o time ganhar - e pediu a quem a conhecesse que lha informasse.
Pois bem, sr. presidente: a fórmula não é "mágica", e eu a conheço! Vou "revelá-la".
Para um time ser vencedor, são necessárias algumas coisas... São elas (não estão em ordem de importância):
1) Uma boa estrutura - o Atlético tem uma das melhores do Brasil.
2) Uma torcida numerosa e entusiasmada - também nesse quesito, o CAP está muito bem servido.
3) O principal: bons jogadores. Não se faz um time campeão sem bons jogadores. Esse é o "segredo de Polichinelo".
4) Secundariamente, um bom técnico.
5) Por fim a estabilidade que vem de bom patrimônico, sustentabilidade financeira (que evite negociações que desmontem o time apenas com o fim de lucro), um corpo diretivo sério, honrado, que garanta boas condições de trabalho: salários bons, pagamentos em dia, segurança, contratos convenientes para os atletas e vantajosos para o clube.
Nenhum time de futebol progride sem títulos. Títulos se ganham dentro de campo. Nas quatro linhas, o que vale é um bom time, formado por jogadores de qualidade.
E pode ter certeza de que os quase 20 mil sócios que pagam mensalidade prefeririam ter um bom time em campo a ver a Arena terminada.
Portanto, sr. presidente, nada "desconhecido", "mágico" ou mirabolante. Com as condições que o Clube Atlético Paranaense tem hoje, pode ter um time campeão. É só fazer o óbvio...
Para terminar, um pedido: não tragam o Geninho. Não agora. Quando o CAP tiver um time decente, com bons jogadores, aí sim será a hora de trazer Geninho de volta, com um longo contrato, com estabilidade, quando o clube tiver capacidade para manter bons jogadores. E então o Atlético poderá ocupar o lugar que merece, entre os melhores dos melhores do país.
Pois bem, sr. presidente: a fórmula não é "mágica", e eu a conheço! Vou "revelá-la".
Para um time ser vencedor, são necessárias algumas coisas... São elas (não estão em ordem de importância):
1) Uma boa estrutura - o Atlético tem uma das melhores do Brasil.
2) Uma torcida numerosa e entusiasmada - também nesse quesito, o CAP está muito bem servido.
3) O principal: bons jogadores. Não se faz um time campeão sem bons jogadores. Esse é o "segredo de Polichinelo".
4) Secundariamente, um bom técnico.
5) Por fim a estabilidade que vem de bom patrimônico, sustentabilidade financeira (que evite negociações que desmontem o time apenas com o fim de lucro), um corpo diretivo sério, honrado, que garanta boas condições de trabalho: salários bons, pagamentos em dia, segurança, contratos convenientes para os atletas e vantajosos para o clube.
Nenhum time de futebol progride sem títulos. Títulos se ganham dentro de campo. Nas quatro linhas, o que vale é um bom time, formado por jogadores de qualidade.
E pode ter certeza de que os quase 20 mil sócios que pagam mensalidade prefeririam ter um bom time em campo a ver a Arena terminada.
Portanto, sr. presidente, nada "desconhecido", "mágico" ou mirabolante. Com as condições que o Clube Atlético Paranaense tem hoje, pode ter um time campeão. É só fazer o óbvio...
Para terminar, um pedido: não tragam o Geninho. Não agora. Quando o CAP tiver um time decente, com bons jogadores, aí sim será a hora de trazer Geninho de volta, com um longo contrato, com estabilidade, quando o clube tiver capacidade para manter bons jogadores. E então o Atlético poderá ocupar o lugar que merece, entre os melhores dos melhores do país.
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